"Overmães": elas exageram na dose

sábado, 15 de maio de 2010
Os filhos podem adorar ter alguém para resolver tudo por eles, mas algumas atitudes podem dificultar a chegada deles à vida adulta

Hoje o filho de Lusia Nunes Milagre, Arthur, de 20 anos, vai para lá e para cá sozinho. No entanto, Luzia conta que isso só começou a acontecer há cerca de dois anos, quando ele tinha 18: “Até para fazer a matrícula da faculdade, falei para o meu marido ir junto, porque ele nunca tinha andado por aí sozinho”.

Até que a criança cresça e aprenda a caminhar com suas próprias pernas, é a mãe que, em geral, dá toda a atenção e protege a criança dos perigos do mundo. Porém, nessa ânsia de acertar e porteger, é normal que muitas passem dos limites e acabem dando mais do que os filhos necessitam. Lusia, por exemplo, admite: “Eu fazia questão de levar e buscar sempre, acho que acabei sufocando um pouco o Arthur, mas a gente só vê que errou depois que passa”.

De acordo com Beatriz de Andrade Sant’Anna, neuropsicológa do NANI (Núcleo de Atendimento Neuropsicológico Infantil Interdisciplinar), existem muitos pais que se esquecem que uma das coisas mais importantes a ser ensinada ao filho: a independência. Mas, para isso, é preciso que eles possam tentar resolver seus próprios problemas com autonomia. “Se os pais sempre tomam à frente e resolvem os conflitos e as indecisões dos filhos, eles tiram a possibilidade da criança desenvolver as próprias ferramentas”, explica Sant’Anna.

E não é somente este tipo de atitude que torna uma mãe superprotetora. De acordo com Tereza Mito, Coordenadora da Clínica Psicológica da Universidade Mackenzie, em São Paulo, e especialista em psicoterapia infantil, às vezes os pais percebem os filhos mais frágeis do que são na realidade, o que pode prejudicar o desenvolvimento da criança: “A criança vai se reconhecendo através de como a mãe o trata, então pode acabar se achando frágil de verdade”. A especialista explica que isso pode acontecer porque o filho acaba sendo tratado com base nas necessidades da mãe – e não em suas próprias.

Deixo ou não deixo?


A mãe de Rebecca, de oito anos, Amanda Medeiros Zeronezi, assume ser um pouco neurótica com o bem-estar da filha. “Ela tem sinusite, então, raramente eu a deixo ficar na piscina ou tomar um sorvete, só se estiver um dia bem legal para isso. Tenho medo que ela fique gripadinha”, explica.

Segundo Amanda, ela também ainda não deixa a filha brincar na casa das amigas e, quando as amigas da filha vão à sua casa, ela utiliza uma babá eletrônica para ouvir o que está acontecendo no quarto e fica sempre por perto. “Reconheço que talvez pudesse deixá-la um pouco mais livre, mas é difícil”, diz Amanda, que sabe que quando a filha ficar mais velha, não poderá controlá-la tanto.

Tereza Mito conta que, enquanto uma criança estiver restrita ao universo familiar, protegê-la demais não traz nenhuma grande dificuldade. Elas mesmas irão demonstrar limites, querendo fazer as coisas por si mesmas e reagindo ao tratamento exagerado da mãe. “O problema é quando a criança amplia os laços de relacionamento e passa a demonstrar que tem dificuldades de entrosamento ou é rejeitada nas brincadeiras, por exemplo”, diz.

Segundo a especialista, uma mãe superprotetora ou que faz tudo para o filho pode atrapalhar a formação da criança, principalmente ser for muito extremista. Se superproteger muito, ela acaba gerando uma insegurança até chegar à fase adulta. Se mimar demais, a criança acaba não se preparando para o mundo e, no primeiro obstáculo, pode sentir-se completamente fracassada. Para a neuropsicóloga Sant’Anna, relações assim podem acarretar adultos sem capacidade para resolver problemas e com ideias irreais a respeito do mundo.

Mimar para demonstrar carinho

Maria Christina Nishimura Da Cruz, mãe de Gabriela, de 23 anos, acredita que se não tivesse parado de dar tudo o que a filha queria, hoje a situação seria diferente. “Quando eles eram pequenos, eu exagerada com meus filhos, principalmente com a Gabriela. Tinha vontade de comprar todas as roupas para ela e a enfeitava muito”, conta.

Até a chegada da adolescência de sua filha, Maria Christina foi assim, mas ela mudou com o tempo para não passar valores equivocados. “Eu mimava para demonstrar carinho, mas tive que ir dosando para não afetar lá na frente”, conta. Segundo ela, um dia Gabriela chegou a dizer que nunca tinha recebido um “não” na vida, mas após passar de uma determinada idade, passou a ouvir e aprender os limites.

Segundo Sant’Anna, mimar uma criança de maneira exagerada pode fazer com que ela não se prepare corretamente para o mundo e, na pior das hipóteses, se torne uma pessoa auto centrada, com uma capacidade reduzida de enxergar o próximo. “Esta característica pode trazer dificuldades importantes de relacionamento”, explica.

Abaixo, veja algumas dicas das especialistas para não exagerar na dose e fazer com que seu filho aprenda a ser independente:

- Respeite a individualidade: aceita a criança como uma pessoa que tem gostos e necessidades próprias e diferentes das suas

- Evite se antecipar: espere que a criança peça por ajuda, deixe que tente sozinha antes

- Quando for ajudá-la, faça com que ela participe da resolução do problema

- Reforce sempre seus sucessos, mesmo que parciais

- Dê pequenas tarefas à criança e inclua-a nas atividades domésticas

- Mostre que ela pode alcançar algo que deseja por si só: não há nada melhor para a autoestima

- Pense na necessidade da criança, e não na sua: não queira dar tudo o que você não teve na infância, por exemplo. Ela pode estar precisando de outras coisas

- Respeite os diferentes gostos e necessidades do filho, mas não se sinta obrigada a dar tudo o que ele quer

- Sempre se questione: “meu filho precisa mesmo disso?”

Autora da Matéria: Renata Losso

Quando a letra feia vira um problema.

Especialistas explicam sobre a disgrafia, distúrbio de aprendizagem ligado à escrita

A letra feia e ilegível, vista muitas vezes como resultado da falta de capricho, pode indicar um distúrbio de aprendizagem chamado disgrafia. O problema, que costuma ser observado um ou dois anos depois que a criança aprende a escrever, pode estar ligado a uma deficiência na coordenação motora fina ou até a um conflito emocional.

Segundo Simone Capellini, professora e pesquisadora do departamento de Fonoaudiologia da Unesp, o que diferencia uma letra sem capricho da disgrafia é a criança ter também outras dificuldades motoras leves, como problemas na hora de amarrar o sapato ou abotoar a camisa. “Disgrafia está ligada à dificuldade que a criança tem em coordenar as informações visuais e a realização motora do ato. Se a criança tiver apenas dificuldade para escrever, mas não apresentar problemas em outras atividades motoras, provavelmente ela não tem o distúrbio”, explica.

Apesar de muitos disléxicos apresentarem disgrafia, nem todos os disgráficos têm dislexia, que é uma dificuldade geral nas áreas da leitura, escrita e soletração das palavras. A diferença básica, segundo Luciana Reis, fonoaudióloga do Instituto Brasileiro de Medicina de Reabilitação, é que a disgrafia é um distúrbio estritamente do campo da escrita. A criança sente cansaço ao escrever, tem uma desorganização espacial e uma escrita lenta. “Em geral, a criança com este distúrbio não entende o que ela mesma escreve algum tempo depois”, diz.

Raquel Caruso, psicopedagoga e coordenadora da Equipe de Diagnóstico e Atendimento Clínico (EDAC), acredita que os professores costumam demorar a perceber o problema, já que estão mais preocupados com o desenvolvimento intelectual dos alunos do que com a parte visual-motora. “Não se treina muito a parte espacial da criança, então fica difícil exigir depois que ela tenha uma boa escrita”, explica Raquel.

Existem dois tipos básicos de disgrafia: a motora e a pura. A motora atinge a maioria dos disgráficos e é a dificuldade em escrever palavras e números corretamente. Já a disgrafia pura é um pouco mais difícil de ser diagnosticada. Segundo Caruso, é aquela que atinge a criança depois de algum trauma emocional. “Às vezes, a criança tenta chamar a atenção para algum problema através da letra” completa.

Por ser um distúrbio ainda pouco conhecido entre pais e professores, muitos casos passam despercebidos, o que faz com que os disgráficos sejam rotulados como “desleixados”. Se nada for feito, eles podem perder o interesse pela escola e pelos estudos.

De acordo com Reis, a criança que tem disgrafia deve brincar com massinha de modelar, argila e pintar. “Todos os exercícios que trabalham com as mãos são bons”, afirma. Além destas atividades, Capellini destaca também a importância dos esportes. “Eles ajudam muito porque trabalham a orientação espacial e a coordenação motora da criança”, diz. Jogar vôlei, peteca e xadrez podem trazer grandes benefícios para a melhora da letra, porque fazem com que a criança use as mãos e aprenda a planejar os movimentos.

A idade mais indicada para se começar a tratar a disgrafia é a partir dos oito anos, quando a letra começa a se firmar. Quando não tratada, o distúrbio pode trazer problemas mais sérios na vida adulta, entre eles a dificuldade de comunicação. “Para entrar numa faculdade, por exemplo, é preciso escrever uma redação. Se a letra não for legível, o candidato já fica em desvantagem”, diz Raquel. Ela explica também que pessoas com disgrafia geralmente não conseguem se localizar em mapas, pela falta de noção de espacialidade.

Disgrafia pura
A psicopedagoga Raquel Caruso indica alguns tipos de letra e os possíveis conflitos emocionais da criança

- Letra pequena demais pode indicar timidez excessiva

- Letras grandes demais podem indicar uma criança que necessita estar sempre no centro das atenções

- Letras feitas com muita força, que chegam a marcar as outras páginas do caderno, podem indicar que a criança esteja tensa

Letra de paciente do terceiro ano do fundamental: desorganização espacial, cansaço ao escrever e escrita lenta.

Depois do tratamento de 2 meses: letra mais legível e com
traçado menos forte; melhor organização espacial



Autora da Matéria: Camila de Lira
 

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